Métodos
26. Busca
O método é ao mesmo tempo uma busca e um caminho cujo termo é a descoberta.
Não esqueceremos o caráter essencial do método que é ser ao mesmo tempo uma busca e um caminho.
Se é uma busca, é preciso que suponha um fim, e este fim, é preciso conhecê-lo. E há talvez métodos diferentes segundo o fim que se terá primeiro escolhido. Pode-se, em particular, distinguir nele fins teóricos e fins práticos. Contudo, estes fins práticos, é preciso conhecê-los para atingi-los, de tal sorte que são envolvidos eles mesmos por fins teóricos: o próprio do método é buscar descobri-los. Mas supõem primeiro um ato que os escolheu, isto é, um certo movimento da liberdade. O método é a obra da liberdade.
Mas é ao mesmo tempo um caminho, e dizer que é um caminho é implicar: 1° que estamos dele afastados e que vivendo no tempo, somos obrigados a percorrer o intervalo que dele nos separa; 2° que nosso espírito se encontra engajado no real de uma certa maneira, de tal sorte que há uma ordem dos eventos que lhe é imposta pela natureza das coisas: é a ordem temporal, que exprime sua própria limitação; não pode lhe escapar, embora busque introduzir nela uma ordem nova que vem do espírito e que funda a ordem dos eventos ao invés de aniquilá-la; 3° que só se atinge um fim através de uma sequência de intermediários, de tal sorte que o método pode ser definido como uma teoria dos intermediários ou das mediações.
Estas mediações dependem necessariamente da situação original do sujeito, e também do fim que se propõe atingir; mas também da solidariedade indivisível que existe ao mesmo tempo entre as partes do real e entre o espírito e o real. Estes intermediários aliás não são suscetíveis necessariamente de ser deduzidos uns dos outros — o que só pode acontecer na ordem lógica, mas esta ordem não pode ser considerada como aplicável a todos os domínios, responde a um outro fim que a ordem causal, ou que a ordem histórica, ou que a ordem preferencial. Por conseguinte, importa insistir sobre a pluralidade das espécies de ordens e buscar estabelecer entre elas uma correlação sinóptica.
Pode-se tirar do que precede a impossibilidade de imaginar outros métodos que métodos particulares, contrariamente à tese de Descartes. Cada um deles depende da própria perspectiva que o sujeito adota e do fim que se propõe atingir. O método é, portanto, a obra do homem e, como se verá logo, toma como ponto de partida, não o homem, mas o sujeito no qual o próprio homem busca se definir e precisamente pelo exercício do método.
27. Pluralidade
O método não é, como se acredita frequentemente, um meio único de que dispõe o espírito para reencontrar, segundo uma regra, todos os termos da realidade num percurso sucessivo.
Imagina-se sempre que há apenas um só método e que, por conseguinte, nos permite reencontrar segundo uma ordem regrada todos os aspectos do real e estabelecer entre eles uma ordem regrada. Mas há neste empreendimento uma espécie de contradição. Pois seria querer determinar a ordem que reina no real ou a ordem segundo a qual foi ele mesmo produzido, independentemente de toda referência à situação do sujeito ou de um desígnio que adotou, isto é, precisamente das duas condições que permitem definir o método como tal. Tudo o que podemos dizer é que é possível, até um certo ponto, estabelecer uma conexão entre os diferentes métodos, em relação com as diferentes perspectivas nas quais a consciência se coloca e os diferentes fins que se propõe atingir.
28. Partida
O método é constrangido a pôr um termo primeiro que não é um termo distinto do sujeito, mas o próprio sujeito considerado na relação interna de seus elementos entre si e em sua relação com um objeto qualquer.
O que importa mais na definição do método é seu ponto de partida. Ora este ponto de partida só pode residir no termo da reflexão, isto é, no sujeito considerado como uma atividade capaz de pôr por si mesma um objeto qualquer. Mas este objeto será ele mesmo correlativo de um certo fim que o sujeito busca atingir. E este fim se encontrará por sua vez condicionado por sua relação com os diferentes aspectos do sujeito, pela preponderância de um ou de outro, e pela conexão que os une. De tal sorte que o método deve nos obrigar a buscar, no objeto sensível, o fim do desejo enquanto se permanece no domínio do sujeito psicológico, depois a subordinar este objeto sensível a um objeto racional quando o próprio sujeito psicológico entra sob a lei do sujeito transcendental, enfim a subordinar este objeto racional ao valor a partir do momento em que o sujeito transcendental descobre sua própria limitação em relação ao sujeito absoluto. Pois o próprio do sujeito transcendental é com efeito pôr apenas na ideia sua universalidade, ao invés de que o sujeito absoluto propõe no valor ao próprio sujeito psicológico um valor que possa querer e amar. O sujeito é, portanto, o centro em relação ao qual todos os problemas se põem e todas as descobertas se obtêm ao mesmo tempo em seu caráter específico e em sua ordem de subordinação.
29. Análise
O método é uma análise do sujeito e de todas as implicações do sujeito.
Pode-se, portanto, dizer do método inteiro, não apenas que toma o sujeito como ponto de partida, mas ainda que reside ele mesmo numa análise do sujeito considerado em sua natureza própria e nas implicações que supõe. Pois são precisamente os três aspectos do sujeito que nos permitem distinguir domínios diferentes do ser e estabelecer entre eles uma ordem de subordinação. O que, sem dúvida, pode ser considerado como pertencendo à doutrina mais que ao método, tanto o método e a doutrina são estreitamente solidários, mas concerne porém ao método se nos interessamos pelos procedimentos pelos quais caminhamos para estes diferentes tipos de realidade, mais que ao próprio conteúdo que lhes é próprio.
30. Meio
Não é dizer que o homem é o marco de todas as coisas, pois, em sua natureza própria de homem, é um meio entre uma realidade que se subordina e que só tem sentido em relação a ele, e uma realidade à qual se subordina e que lhe dá a ele mesmo seu sentido.
Não se pode dizer que se volte aqui à antiga fórmula de que "o homem é a medida de todas as coisas". Pois onde está o homem em tudo isto, senão no jogo das diferentes potências do sujeito? Ele se cria ou se determina a si mesmo no interior do sujeito sem que seja possível identificá-lo com o sujeito. Ora, no próprio sujeito, distinguimos as potências que, deixadas a si mesmas, são infra-humanas — são as que pertencem ao sujeito individual — de outras potências que, se se lhes dá uma existência separada, são supra-humanas, e potências enfim que, como as que designamos pela expressão sujeito transcendental, definiriam o homem, com efeito, se não guardassem nelas mesmas um caráter irreal e abstrato enquanto permanecem dissociadas das duas outras, e caracterizam o ser finito em geral mais ainda que o ser propriamente humano cf. liv. I, Prop. LX e LXXXI. Diremos, portanto, que o ponto de partida do método é bem o homem, considerado não como um absoluto, mas como um ser que se subordina o sensível e se subordina ele mesmo ao absoluto.
31. Ordem
O método é constrangido a seguir uma ordem sem a qual cada problema se articularia diretamente com a unidade do sujeito e não com os outros problemas, e a reflexão seria exposta a retomadas sem jamais estar assegurada de ser exaustiva.
Pode-se considerar o movimento reflexivo como exprimindo o preliminar indispensável do método, pois é em sua tripla relação com o mim psicológico, o mim transcendental e o mim absoluto, que cada problema particular encontra uma explicação: na ordem sensível que exprime sua relação com o sujeito psicológico, na ordem inteligível que exprime sua relação com o sujeito em geral, e na ordem do valor que exprime sua relação com o sujeito absoluto. Mas é ainda preciso que os problemas particulares tenham relações uns com os outros, sem o que não encontrariam lugar na unidade total da consciência; correríamos o risco de reencontrá-los sempre como problemas novos e nunca estaríamos seguros de ter um fio condutor, nos permitindo abraçar sucessivamente todas as partes do campo da reflexão.
32. Tripla
Há três ordens possíveis: a ordem de inclusão, a ordem de composição, a ordem de complementaridade.
Pode-se conceber então três espécies clássicas de ordem entre os diferentes termos do conhecimento:
A primeira é a ordem da inclusão, na qual estes termos são distribuídos segundo uma ordem de complexidade crescente e de generalidade decrescente: ela é ao mesmo tempo ascendente e descendente. Então a passagem de um termo ao outro se realiza por um termo médio, cuja virtude probante se manifesta de duas maneiras, segundo que estando incluído no primeiro e incluindo o segundo, permita incluir o segundo no primeiro (é a ordem da extensão); ou segundo que incluído ele mesmo no segundo e incluindo o primeiro, permita incluir o primeiro no segundo (é a ordem da compreensão): então o meio não é um simples intermediário, é uma razão de ser.
O segundo é uma ordem de composição, que, ao invés de ir do geral ao particular, vai do simples ao complexo. Então se tem que ver com dois movimentos diferentes, comparáveis às duas ordens inversas de extensão e de compreensão, segundo se parta do complexo para reduzi-lo ao simples, ou do simples para construir com ele o complexo. Tal é o sentido da análise e da síntese.
Enfim, há uma ordem que podemos chamar a ordem da complementaridade, em virtude da qual a noção mais pobre chama o que lhe falta para completá-la. Esta terceira espécie de ordem tomou uma forma particular na história: para tirar o mais rico do mais pobre e deixar ao método sua fecundidade, é preciso que o mais rico não seja suposto, mas engendrado. Desde então, imagina-se um movimento negativo já inseparável da simples afirmação do mais pobre e no qual o mais pobre é negado não no que tem, mas no que lhe falta. De tal sorte que permanecendo fiel à negação, único procedimento que depende exclusivamente do espírito, e negando esta negação por sua vez, obter-se-ia uma afirmação nova, que restabeleceria a afirmação primeira, mas enriquecendo-a indefinidamente.
33. Inclusão
O método de inclusão não deve ser desprezado, mas repousa sobre um sistema de definições, e tem um alcance exclusivamente lógico.
O método de inclusão não merece as censuras que lhe foram dirigidas, pois estabelece entre todas as nossas definições uma ordem sistemática, que permite articulá-las umas com as outras. Mas não se pode considerá-lo como um método propriamente metafísico, que nos mostra a própria ordem entre as coisas, o lugar e a significação de cada uma delas na totalidade do real e não apenas no jogo das convenções pelo qual atribuímos a cada uma delas uma extensão e uma compreensão. Além disso, o gênero mais geral e o indivíduo considerado em sua singularidade lhe escapam igualmente. Mas a objeção mais grave que se pode lhe dirigir é que não há mais sujeito ou que o próprio sujeito se põe como um objeto que não goza de nenhum privilégio próprio no interior da escala dos conceitos.
34. Composição
O método de composição evita os inconvenientes do método de inclusão, mas tem um alcance exclusivamente matemático.
O método de composição busca evitar a esterilidade que se olhou tão frequentemente como o escolho insuperável do método de inclusão. Digamos que ao invés de nos ensinar a reconhecer as relações entre definições já postas, nos ensina a pô-las, nas próprias relações que as unem. Pode-se, portanto, considerá-lo como dinâmico por oposição ao caráter estático do método precedente. Tal é ao menos o aspecto que apresenta sob a forma sintética que se pode lhe dar, e que procede por construção de conceitos, mas que é apenas o avesso de sua forma analítica, a mais fecunda sem dúvida, pois nos permite resolver todos os problemas por redução do mais complexo ao mais simples: a síntese aqui é mais ilusória do que parece, pois pode-se perguntar em nome de que princípio operaríamos, a partir do simples, tal construção mais que toda outra. O sujeito, por oposição ao que se constata no método de inclusão, não se situa ele mesmo na ordem dos conceitos, é imanente a esta própria ordem que nada é mais que o Cogito em ação. Mas além de que há sempre alguma dificuldade aqui no que concerne ao simples, que não é o próprio Cogito, mas o ou os termos indecomponíveis que põe antes de todos os outros e que entram na composição destes, pode-se dizer que a ordem que se descreve aqui é uma ordem de fabricação, que convém admiravelmente às matemáticas e que foi tomada emprestado a esta ciência, mas que sempre se aplicou com uma extrema dificuldade, não propriamente à física pois a própria física é de uma certa maneira redutível às matemáticas, mas à qualidade, da qual se é obrigado a fazer uma ilusão, à ordem psicológica, estética, moral e mesmo metafísica. O que desconhece portanto Descartes, ou sobre o que não insiste bastante, é que a atividade do sujeito é uma atividade de participação e não, como acredita, uma atividade que busca reencontrar a atividade criadora, que tende a se fazer toda-poderosa como ela, e, ao menos no abstrato, a imita por assim dizer à sua maneira.
35. Complementaridade
A ordem de complementaridade se estende sobre um domínio mais vasto que a ordem de composição e apresenta com efeito um caráter sintético, mas não tem um alcance verdadeiramente dialético.
A ordem de complementaridade evita alguns dos perigos da ordem de composição. Não é apenas uma ordem de fabricação, pois não é imposta pelo espírito ao real, traduz apenas o movimento pelo qual o próprio real se faz. Neste sentido é mais verdadeiramente genético que a ordem de composição; não aceitaria ser invertido para nos descobrir a ordem analítica que era o ponto de chegada e a razão de ser da ordem de composição. E, por oposição à ordem de composição onde o espírito está presente no encadeamento dos diferentes termos e permanece independente deles no sentido de que, se é seu artífice, não recebe deles nenhum enriquecimento, aqui o espírito está em marcha com o real e efetua a mesma ascensão. Mas o espírito, desta vez, se encontra naturalizado, quando não o era no método de composição: se encontra, num certo sentido, confundido com seu objeto. E pode-se perguntar, como se fez frequentemente: 1° se o abstrato não é posto primeiro como uma condição lógica da aplicação do método mais que por uma exigência ontológica ou histórica; 2° se o próprio sentido deste desenvolvimento exprime uma necessidade que lhe é verdadeiramente imanente, ou se não é reencontrado de algum modo retrospectivamente, com elementos tomados emprestados à história e entre os quais se estabelecem articulações arbitrárias; 3° se a negação, cujo papel é tão favorável a uma descrição onde a ordem das coisas aparece como uma sucessão de fases, cuja sucessão produz um ritmo que acaba por ter a própria necessidade de uma cadência sonora, não é introduzida aqui como uma espécie de lembrete de uma infinidade sempre presente que não se deixa esquecer e que nos pertenceria, por conseguinte, analisar mais que tentar atualizá-la num desenvolvimento que ela mesma viria sempre reanimar e que nunca teria termo. A positividade aparente da negação é apenas a positividade de uma afirmação pura, de que todas as afirmações particulares exprimem, sem que se tenha necessidade do artifício da negação, a diversidade dos aspectos que permanecem todos solidários. Observar-se-á que há aqui um papel da negação comparável àquele que desempenha na teoria da reflexão, isto é, no limiar do método de composição, tal como foi definido por Descartes: este a bloqueia, por assim dizer, no início da pesquisa, para descobrir a atividade autônoma do sujeito pensante; Hegel a reintroduz a cada etapa da pesquisa para lhe permitir progredir. Observar-se-á, de uma maneira geral, sobre a negação, que é um instrumento eminentemente metodológico cujo emprego depende de um ato do querer, ali onde a afirmação supõe sempre uma aplicação do sujeito ao real, uma conivência com ele. Mas este método não tem um caráter verdadeiramente dialético, se é verdade que o método dialético, ao invés de envolver todas as formas do ser num necessitarismo lógico, se coloca no coração de tal, isto é, no próprio exercício de sua liberdade, para pô-la em relação com todos os aspectos do universo que a condicionam ou que determina. A superioridade do método de complementaridade sobre todos os outros é que é o único sem dúvida que possa pôr em jogo uma potência interna de realização. Somente é talvez contraditório pô-la em jogo num tempo mesmo lógico. Toda criação ex nihilo é intemporal. E o mundo tal como é para nós só pode se constituir na escala da participação.
36. Progressão
O caráter comum destes três métodos é que procedem do mínimo de ser ao máximo de ser.
Estes três métodos têm igualmente por ambição mostrar como todos os modos do real podem ser escalonados entre o mínimo de ser e o máximo de ser. Assim se dá a ilusão de passar do nada ao ser, o que é o ato supremo da criação, ou ao menos de se aproximar na própria medida em que nossas forças o permitem. No método de inclusão, onde parece que o todo é pressuposto pelo movimento lógico que o analisa, esta gênese é apenas uma gênese puramente ideal. No método de composição, é uma gênese ideal, mas que busca coincidir com a gênese real, e permite agir sobre ela para lhe infletir o curso. No método de complementaridade, as exigências da razão e as exigências do ser não podem mais se distinguir: as duas ordens se recobrem. Todas três, por uma espécie de progresso contínuo, legislam para um sujeito que tenta reencontrar a ordem que existe no real, tal como subsistiria se ele mesmo enquanto sujeito viesse a desaparecer, ou ainda, o que equivale ao mesmo e acentua o paradoxo, se fosse ele mesmo um sujeito desprovido de ligação com o sujeito psicológico, seja que o sujeito transcendental seja elevado até o absoluto, seja que o sujeito absoluto rompa toda relação com o sujeito transcendental.
37. Dialética
O caráter original do método dialético é partir da própria consciência, considerada neste jogo interior do qual mostramos que é a condição de possibilidade de tudo o que podemos conhecer.
A reflexão nos mostrou, como havia mostrado a Descartes, que é preciso remontar ao sujeito para dar conta do dado; não que este dado seja abolido, mas só recebe sua significação por sua relação com o sujeito. Deste sujeito posto primeiro, vai-se, portanto, tentar tirar agora os diferentes aspectos do dado, não simplesmente para pô-los de novo tais como nos eram primeiro dados, mas para lhes pôr o sentido, agora que sabemos a própria maneira como podem ser postos. A própria ideia desta posição, como se mostrou na proposição XLV do liv. I, é ambígua: pois pode-se pôr todo o real supondo que precede o ato que o põe, embora este ato possa influir sobre a própria maneira como se oferece ao nosso pensamento; então diremos que o pomos como espetáculo. E pode-se pô-lo como se o criássemos pelo ato que o põe. O que permite opor o idealismo e o realismo. Mas não temos a este respeito nenhum preconceito. E poderemos distinguir no sujeito, se houver lugar, diferentes modos de posição do real, como se dispusesse ao mesmo tempo de uma atividade espetacular e de uma atividade criadora. Pois sabemos que o sujeito não é simples, e é mesmo porque não é simples que basta para sustentar a diversidade infinita dos aspectos do real, de que o próprio do método é mostrar qual é a correlação que podem ter com ele.
38. Particularidade
Só há problemas particulares, que são todos postos pela experiência da vida; só se pode resolvê-los definindo suas relações com os outros elementos da experiência.
É preciso dizer, não sem dúvida do mundo, que pede sempre para ser pensado, mas do ser em sua totalidade, que não pode ser considerado como um problema. Pois pode-se dizer que se faz a si mesmo, antes de se ter posto como um problema. Todos os problemas lhe são interiores. E para quem seria um problema? Para um ser particular que dele faz parte e que o tomaria como objeto? Mas em vista de que fim, senão de conhecê-lo? O que é, com efeito, um fim particular entre muitos outros. Talvez poder-se-ia dizer que todos os problemas são postos pela experiência da vida, ou ainda que exprimem as exigências próprias às diferentes funções da consciência desde que começam a se exercer, de tal sorte que todos os problemas são com efeito problemas particulares. E não comportam outra solução que a colocação em relação de cada um dos elementos da experiência com todos os outros segundo sua ordem sinóptica ou hierárquica.
39. Centro
O centro do método reside numa certa relação que deve se estabelecer entre o homem e o sujeito ou entre a atividade de participação e a atividade criadora.
O método é a obra do homem, mas o homem assumindo a vocação de sujeito se obriga a estabelecer, entre as diferentes formas de subjetividade, uma subordinação que deve se engajar a manter em todas as operações que cumpre. Depende dele fazê-la reinar, só consegue no tempo, e por uma série de obrigações que constituem precisamente o método. Ela traça ao homem o caminho que deve seguir para que possa preencher adequadamente seu papel de sujeito.
Poder-se-ia explicar a mesma ideia de uma maneira um pouco diferente. Para que um método seja possível, é preciso que haja sempre um intervalo entre aquele que o aplica e o objeto ao qual o aplica: assim acabamos de falar de um intervalo entre o homem e o sujeito.
Poder-se-ia também, utilizando uma distinção anterior Prop. XV acima, dizer que o método supõe um intervalo entre a atividade reflexiva e a atividade criadora; busca reuni-las, só consegue se descreve todo o real que preenche o intervalo, isto é, o mundo, mas de tal maneira porém que a atividade reflexiva, buscando reduzi-lo, venha coincidir com a atividade criadora, cujo papel era produzi-lo. Daí vêm, de uma parte, não apenas todos os esforços pelos quais se quer que o método seja uma verdadeira reconstrução do real, mas ainda o esquema clássico de todos os métodos que se reduzem a uma análise que deve se mudar em síntese, a uma indução que, quando chegou a seu termo, se converte em dedução.
40. Posição
O sujeito pode ser posto fora do mundo mas não fora do ser.
Compreende-se bem que se possa pôr o sujeito fora do mundo, para que possa pensar o mundo. Ora na hierarquia dos sujeitos, o sujeito psicológico está no mundo para o sujeito transcendental, e o sujeito transcendental no mundo para o sujeito absoluto. Mas a relação dos três sujeitos um com o outro não pertence ao mundo considerado enquanto mundo dado e constituído por fenômenos, embora o sujeito só possa ser posto em relação a ele e para sustentá-lo, o que inclinou os filósofos a pôr este sujeito como puramente formal. É ele, ao contrário, que põe sua própria existência como condição mesma da existência de todas as coisas que podem ser postas, e que só o são por ele e para ele, isto é, como fenômenos.
41. Escala
Os três aspectos do sujeito exprimem uma escala de participação, e, quando se eleva de um ao outro, este se torna um objeto para aquele.
O sujeito pode ser considerado sob três aspectos diferentes: pois enquanto exprime uma certa perspectiva que temos sobre o mundo, está ele mesmo no mundo como o próprio centro desta perspectiva: neste momento, torna-se um objeto entre todos os outros. Mas o mundo se torna ele mesmo então uma experiência comum a todos, e, enquanto sujeito transcendental, é o autor desta experiência, como era o autor, enquanto sujeito psicológico, da perspectiva individual que tomava sobre o mundo. Mas como o sujeito psicológico se inscreve ele mesmo na atividade transcendental que determina, o sujeito transcendental se inscreve num sujeito absoluto ao qual participa segundo leis gerais que são comuns a todos os sujeitos psicológicos. E é por isso que, como o sujeito individual se tornava um objeto entre os objetos quando se o referia ao sujeito transcendental, o sujeito transcendental se torna uma ideia entre as ideias quando se o refere ao sujeito absoluto.